A - F É - C R I S T Ã

Na perspectiva da Boa Nova

--------Se na ordem da Criação se realiza a ordem da Salvação; se Deus realmente se partilha com a criação, então, na criação há algo de consubstancial a Deus. Neste sentido, quem partilha com outros o que é, tem e faz, partilha com Deus. Quem vê traços de Cristo no rosto de alguém, respeita o mistério de Deus. O que nunca podemos dizer é que Deus, simplesmente, coincide com sua criação. De fato, Jesus tinha de reconhecer : “O Pai é maior que eu” (João 14,28).

--------Se há Deus, na condição de Pai de Jesus, há um amor absoluto que envolve a Criação, em todos os seus componentes. Se há Jesus, como “irmão primogênito”, há uma origem e um destino divinos que marcam nossa condição humana. Se há amor incondicional de Deus, não pode haver simples retribuição entre Deus e suas criaturas. Não pode haver destaque para sacrifício, expiação, holocausto, nem para queda com redenção. O que há é Criação com Salvação, desde sempre.

--------Se há Deus em Aliança com a Humanidade, não há distanciamento entre céu e terra, mas há progressiva integração entre história e graça. Se há Deus e graça oni-presentes, não há, primordialmente, Igreja com desempenho de funções mediadoras. Há, sim, prévia Comunhão e Participação por parte de todos. Se há “Fazei isto em memória de mim”, não há necessidade prévia de arrebanhar almas mediante sacramentos que celebram a gratuidade da graça que precede a tudo.

--------Se, primeiro, há vida, amor, encontro e celebração, há, somente depois, função sacramental. Se, desde o início, há “Verbo que se fez carne” e “Espírito que paira sobre as águas”, há, somente depois, função ministerial e graça sacramental. Se, desde sempre, há DNA divino em tudo e todos, há amor que envolve e abraço que integra gratuitamente todos. E não pode haver lugar para medo a insinuar distância ou abandono, não há separação nem pecado que exige resgate.

--------Deus em sua relação com a humanidade transcende o poder e a função da religião. Na Igreja, as funções – ensinar, conduzir, santificar – estão a serviço das pessoas, mas a relação com Deus não se limita ao desempenho dessas funções. Função não é ponte de acesso à graça, estando, esta, presente a e em tudo e todos, como Deus. A graça há de ser melhor assumida e fecundada pela função, ajudando-a para agir na realidade e irradiar-se no viver e relacionar das pessoas.

--------No Cristianismo, Deus se apresenta Uno e exclusivo – fora dele não há Deus -. O mistério da Trindade simboliza a proximidade de Deus à sua Criação. No Filho, Deus se revela como Pai (Mãe) para seus filhos. No “Espírito”, ele se revela como o cerne da história, na qual, receptivas, as pessoas hão de conduzir-se por luz e energia divinas, à guisa de um sopro. Ao atribuir-se ao homem Jesus uma singular intimidade com Deus, ele é, ao mesmo tempo, essencialmente familiar com todas as pessoas, incluindo, amorosamente, até os mais diferentes.

--------A fraternidade se fez extremamente enriquecida, uma vez que a graça não é veiculada por um poder funcional, mas pelo testemunho do amor fraterno: “Eu vim para servir”. Os portadores do poder são convidados a se fazer “últimos”. De ora em diante, através de relações fraternas de serviço, na comunidade (clesial), se comprova que todos somos irmãos na condição de filhos, sendo Jesus “o Primogênito de um grande número de irmãos”? (Rom. 8,29) E reina a liberdade!

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Frei Cláudio van Balen