FUGA OU MUDANÇA?
(O Profeta Jonas)

Diante dos desafios da vida, com seus problemas difíceis, a estratégia da fuga é adotada e, não raro, com indevidas proporções, para nos livrarmos de tarefas incômodas, optando por uma forma de acomodação. Há quem, vendo ou ouvindo um apelo de ajuda, finge não vê-lo, ouvi-lo; há quem, recebendo correspondência, adia o momento de abri-la; há quem inicie uma terapia para não se mudar; há quem use o telefone para não se confrontar consigo; há quem recuse ver a situação de sua realidade bancária, como há aluno que recusa informar-se a respeito de suas notas; há quem se acovarde debaixo de pressões ou ameaças, fugindo para cigarro, comida, álcool, reza brava, jogo, droga ou sexo; há tantos que usam de internet, religião ou de uma prece para garantir uma fuga elegantemente mascarada.

Fugir de problemas e responsabilidades é algo cotidiano, porém nisso pode haver algo mais do que simples medo de encarar a vida. Não se trata, então, somente de fechar os olhos à realidade. Assim, quem foge de si ou de seus problemas para recriminar outros, não raro, se eleva indevidamente acima dos mesmos para não se confrontar com a própria ambivalência. Não estaria aqui uma das principais razões que nos levam a criticar ou comentar a vida, o jeito de ser de alguém? Apontar erros alheios é um modo eficaz para se enganar a respeito de si mesmo, na defesa contra o perigo de sofrer alguma crítica. Quantas vezes, por uma ideologia de adaptação, privamos de seu valor escolhas e atitudes alheias – em arte, política, música, jornalismo, religião, economia e comunicação - para nos sentir desobrigados das mesmas. Perto e longe imperam preconceitos contra minorias, como crianças de rua, homossexuais, aidéticos, sem-terra, estrangeiros, adeptos de religiões e espiritualidades e tantas outras modalidades de excluídos.

Fugas significativas de transformação se fazem possíveis a partir do vigor da fé que estimula e orienta no esforço de nos libertarmos da frieza de uma estratégia calculista de acomodação. Fé solidária nos capacita para sacrificar interesses imediatos e objetivos pessoais, rebelando-nos contra uma rotina opressora com sua covarde resignação. A Bíblia nos apresenta formas de fuga positiva, como Abraão que se afasta dos ídolos de seus antepassados, dirigindo-se ao desconhecido; Moisés que assume a luta e faz todo um povo fugir do Egito,sem conhecer o que acontecerá; o profeta Elias que, confiando em Deus, foge em direção à promessa; Jonas que, antes fugitivo, abandona a fuga para ajudar uma cidade toda a fugir da desgraça; João Batista que foge para o deserto; Maria que foge de um projeto personalista, e Jesus que convida a fugir da mediocridade em direção ao Reino, em que uma suave brisa servirá de inspiração.

Hoje o mundo é invadido por ondas de fugitivos devido à insegurança climática ou econômica, conflitos políticos, perseguição religiosa, terrorismo, fome, falta de emprego, corrupção na política e catástrofes sociais, cujas vítimas são assistidas por organizações (inter) nacionais e iniciativas particulares. Em tal ambiente é de decisiva importância que os cidadãos se conscientizem do sofrimento imposto a dezenas de milhões de pessoas e que colaborem para a reintegração dos mesmos em uma convivência solidária. Um mar de tristeza clama por novos motivos de esperança, graças ao engajamento de fé na luta pelos direitos humanos . E lembremos: “O mínimo que tivermos feito a um deles, será considerado o mais nobre serviço prestado a Deus”. Dentro e fora de nós, perto e longe, há tantos fugitivos que nos revelam algo do rosto, do silêncio e do sonho de Deus. Que a parábola de Jonas nos estimule a reintegrarmos em uma vida de boa qualidade tantos fugitivos.

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Frei Cláudio