ESPELHADOS  NO  PAI ?

 

Pai Sucedâneo.

 

Estamos diante de um vazio de pai? Adora-se à figura papal, mais pelo símbolo que pelo cardeal que se tornou papa. Papa ‘pop star’  é demais para quem sabe que a virtude se exerce quando o ser humano se faz pai e mãe de si mesmo, capaz de auto-guiar-se do ponto de vista de valores, buscando, pelo próprio esforço, o aconchego de que necessita. “Habemus Papam”. Nós mesmos precisamos fazer-nos papa. Sim, sejamos Papa, condutores espirituais de nós mesmos, seres de autonomia, exercitando-nos na missão de sermos dignos e livres”.  (Roberto Patrus - em reação ao que segue.)

 

Em uma cultura laicizada - fragmentada em uma convivência descartável e de vazio existencial - ficamos reféns de um sucedâneo de Pai. Deus distante?

A riqueza da vida suscita criatividade nas pessoas. Em clima de tempestade, há quem se deixe vencer pelo medo, agarrando-se à figura carismática do pai. É filho(a) a perder-se no pai.

 

Somos relação - estamos-no-mundo-com-os-outros – carecemos de uma práxis de transcendência, de um ideal coletivo,  de uma autoridade a garantir unidade.

Dominados pelo medo em uma metamorfose permanente – o pensável e temível se mostrando possíveis - carecemos de um  Deus objeto de consumo. Insegurança no infantilismo.

 

O vazio da paternidade papal faz emergir- em certa camada – uma carência religiosa. Um passo para a fé religiosa fantasiar a proteção paterna?  Projeção.

Fascina a ciência, encanta a tecnologia, mas o povo sofre e reclama um pai-Papa, que se mostre sustento e aconchego para a sobrevivência espiritual. Imaturidade. Subjugação.

 

Pai garante o bem-estar de filhos, mas em tempo pós–ideológico muitos buscam uma religiosidade pluri-valente. Pai salva do nada, da  ameaça do sem-sentido?

A conquista de pão, poder e prazer deturpa a religião, criando um Deus Salvador que se torna um provedor espiritual mágico. Pai se torna des-educador.

 

Na vida artificial, há um risco: o vazio da cultura suscita uma mística que, na figura do Papa-pai, faz de Deus-Tapa-Buraco, hóspede de um dia.Retorna o vazio.

Em um mundo de tantos caminhos e de realidades virtuais que assustam, é natural que, aflitos, muitos retornam a uma fé infantil primária. Ignorância da própria riqueza. Compensação.

 

A mídia governa, o físico triunfa, a droga exorbita, o sexo coisifica, o rito domina, religião e Deus se tornam mercadoria a encher praças e auditórios. Gente joguete.

Espiritualidade como consumo. O medo do vazio se torna produto. Triunfa a insensatez, vence a mediocridade. Inocência e perspicácia são desconsideradas. Salvação vem de cima, de fora.

 

Na modernidade,  há sinais de que a religiosidade – pão e circo – é sintoma de mercantilismo com novas formas de imaturidade, de exploração e aprisionamento.

O pai morreu? É preciso que renasça em mim. Religião é para amarrar vida ao transcendente, ao encontro criativo, à capacidade de ser e de se relacionar, suscitando a alegria da busca.

 

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                                                                                                                                     Frei Cláudio van Balen