EXPRESSAR-SE  EM  LÁGRIMAS

 

Há tempo para rir e tempo para chorar”.

                                                       (Ecles.3,4)

 

Linguagem eloqüente, a lágrima para ser benéfica precisa expressar relação. Quando sinal de abertura da pessoa ao mistério de si mesma, dos outros e de Deus, as lágrimas revelam e confirmam em nós um traço de autenticidade e, nisso, se fazem mediação de relações. As lágrimas podem simbolizar a emergência do sentimento tanto de envolvimento como de abandono. Chora quem vê o filho nascer e chora quem se despede de um ente querido, chora quem sofre uma derrota e chora quem ganha um prêmio, chora quem se arrepende de uma falha ou ofensa cometida e chora quem é perdoado ou quem oferece o perdão.

 

Chora quem experimenta a gratuidade de uma dádiva e chora quem é punido, chora quem se decepciona com a dureza da realidade e chora quem realiza um sonho; chora quem encontra seu amor e chora quem julga ser privado de valor. Chora quem sofre uma violência e chora quem é socorrido em uma premente necessidade. Chora quem embarca para uma longa viagem e chora quem, encantado, assiste a um belo espetáculo. Claro, a lágrima não é algo apropriado a qualquer situação. Ela pode reverter em proveito de quem maltrata, com prejuízo para quem chora. Meio de defesa desvalorizado, pode tornar-se neurótica e instrumento de manipulação.

 

As lágrimas têm uma função compensadora; restauram um equilíbrio emocional e reatam um laço social, restabelecem a afetividade pessoal e reforçam o fervor coletivo. Nas lágrimas, o corpo se exprime e o espírito se comunica. Como palavras e imagens, as lágrimas sinalizam e reforçam os laços que nos unem à realidade externa como revelam os sentimentos que nos agitam interiormente. Em sua função catártica, as lágrimas libertam do peso da emoção; e em sua leveza solidária, elas identificam com próximos e aproximam de distantes. Com fluidez, as lágrimas evocam valores como doçura, compaixão e ternura em relação fraterna.

 

Se, na vida social, uma euforia funcional se impõe, tristeza autêntica e alegria pura se harmonizam com alguma lágrima, desde que não seja o único meio de se afirmar ou de se defender entre liberdade e dominação. Mostrar sua emoção por uma lágrima é avivar sua confiança na capacidade de quem se dispõe a nos acolher. De fato, a lágrima, como o riso, identificam e assumem emoções, o que é fator humanizador. Dessa forma, abrem fronteiras em relações interpessoais com um novo encontro e, às vezes, com chance de saúde melhorada. Nesse sentido, felizes os que sabem rir e chorar; donos de si, podem revelar-se inseridos no contexto.

 

Liberadora de tensões, auxílio para o psiquismo e benéfica para a saúde por diminuir a pressão arterial, a lágrima defende contra colite e úlcera bem como protege contra patologias ligadas à estresse. A lágrima equilibra secreções gástricas, a respiração e o ritmo cardíaco. Dotada de um poder misterioso, ela protege o olho e gera substâncias bactericidas e cicatrizantes.  Expressão do reconhecimento da própria fragilidade, a lágrima se faz ponte de um encontro com o mais profundo em nós que, sensível ao bem, nos faz vencer o mal e assumir a reconciliação, ampliando nosso círculo de relações.

 

         Bem-aventurada a pessoa que,  em tempo oportuno, sabe chorar, porque ela mesma planta a semente de seu conforto que a sustenta na luta da vida e em um clima de frutífera convivência. Sua lágrima se faz moldura de bênção divina.

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                                                                                                                             Frei Cláudio van Balen