UM  OLHAR  SOBRE  A  IGREJA

 

No atual contexto cultural, a prática da fé exige que a sintonizemos com as necessidades humanas, culturais e espirituais das pessoas que buscam um encontro mais personalizado em suas relações e uma presença mais responsável e solidária dentro da família e da comunidade. A experiência de encontros profundos não acontece tanto no nível de normas e doutrinas (poder), mas no setor da convivência (amor), com participação e comunhão (busca, diálogo, cooperação, serviços).

Na ação pastoral é preciso que nos orientemos para esta mentalidade moderna, que valoriza sentimentos e experiências envolventes como acolhida, partilha, confirmação, solidariedade e criatividade. Em tal dimensão de Igreja, pesa menos a dimensão hierárquica, precisando as pessoas ser mais inspiradas que conduzidas.

 

Em um ambiente fragmentado, são menos intensas a estrutura e a identidade da vida de fé, enquanto o processo de individualização deixa as pessoas andar com seus próprios pés, sem dispensá-las de descobrir e delinear, por uma ajuda mútua, suas verdades subjetivas dentro de uma tradição que,  na liberdade, merece respeito, pois é nela que (re)vitalizamos a religiosidade.

Acontece que, perto e longe, há entre os fiéis tantos que percebem a Igreja qual mãe ultrapassada, pela qual ainda têm um carinho de gratidão e respeito por lhes ter legado valiosas riquezas de vida. Mas ela lhes dá, não raro, a impressão de manter-se distante demais da atualidade com seus problemas, perspectivas e anseios modernos, que pedem adesão e profunda renovação, também na vida da fé e da religiosidade.        

 

Clamamos por uma Igreja que amenize sua ansiosa preocupação doutrinária e disciplinar e, em vez disso, ouse mergulhar na ousadia do amor com diálogo e multiforme participação. Só desta maneira, ela será capaz de manter suas portas abertas em forma de acolhida, até mesmo para aqueles que, do lado de fora, dão testemunho de uma corajosa luta por mais justiça e fraternidade com libertação e integração.

Historicamente, somos forçados a perceber o poder na Igreja muito autoritário e centralizador, no que diz respeito, prioritariamente, ao que ela considera como verdades e valores, mal se dando conta de que os mesmos têm de desdobrar-se, progressivamente, ao longo do acontecer histórico com a participação de toda a comunidade. O Magistério não tem como missão ditar normas, mas inspirar na busca da verdade.

 

Jesus não formou uma Comunidade de doutores e alunos, mas um movimento de irmãos, em clima do serviço de autêntica cidadania libertadora, mostrando-se fiel aos “sinais dos tempos” e identificada com o processo histórico, sempre em evolução. Há de fazer-se sensível às necessidades e potencialidades de pessoas, grupos e povos, de filosofias de vida, culturas e religiões, no respeito aos novos dados da ciência.

Na perspectiva de nossa fé, acreditamos que a graça divina , está onipresente, tanto no progresso científico e tecnológico como no todo da modernidade com seu decréscimo na pertença a uma religião determinada. Cabe justamente à Igreja testemunhar que o Reino de Deus está presente nas realidades cotidianas e nas realizações humanas; e que hoje seus fiéis, mais que ovelhas passivas na obediência, hão de ser cidadãos participantes e místicos no dinamismo do Espírito. Tanto homens como mulheres.

 

Será que estamos enganados? Parece-nos que Igreja-Instituição mostra não ter consciência da imensa e sempre atual riqueza da Boa Nova do Evangelho. Em vez de testemunhar essa dádiva inserida no coração humano e presente no bojo dos fatos, ela dá a impressão de querer instrumentalizá-la a favor de sua própria estrutura com um poder vertical, isolador e prepotente.

Na Igreja, somos todos iguais, lembrou Jesus. Ela não deve excluir, mas valorizar os que julgam como seu dever, à luz da atualidade, questionar ditames doutrinários, morais, litúrgicos e disciplinares enraizados em um longínquo passado. Tampouco, ela tem poder para, policialmente, separar dignos de indignos, à Mesa do Serviço e do Pão. Mudar, renascer e colaborar é ordem básica do Evangelho.

 

Precisamos colaborar para que todos os cristãos se distingam, confiantes e generosos, por um entusiasmo enraizado em sua fé, motivando-se a assumir sua parcela de responsabilidade nas comunidades da Igreja e nos distintos setores da sociedade, participando em movimentos civis e organizações de cidadania. Todos somos chamados a dinamizar a convivência humana por uma renovação no exercício da consciência, da vida de fé, da religião e da participação política.

                                               “Eis que faço novas todas as coisas”.                       Frei Cláudio van Balen